Agrande Peça..
Como atores, disciplinados, vivemos o “script” da vida, que nos escreveram.
Das platéias, que nos assistem, aguardamos ansiosos seus aplausos
e seguimos as tramas dos dramas e comédias de cada ato, com o rigor que nos prescreveram.
Insensíveis escritores, que nos negam o improviso; engessados, somos personagens falsos.
Vivemos a satisfazer esse público, que não nos veneram como atores e nos abominam
como homens; nos consomem com suas falsas regras de pudor desavergonhado,
que nos impõem, para sermos consentidos como parte dessa farsa e nos dominam
como a uma criança, se desobediente, que o castigo o espera, se apanhado.
Nos castramos de nossas vontades, desejos, sentimentos não expostos, contidos,
que ainda nos sufocam, engasgados pela desesperança de nossos personagens,
ante uma vida repleta de desafios, perigos, decepções constantes, diários, repetidos,
cujo enredo não previu; no palco estáticos, mudos , sem recompensas ou homenagens
Pois, melhor apartados dessa divina comédia, que a tortura de nos anularmos
e tolerarmos a presença de outrem, que nós não somos, e, como expectador, assistirmos
a peça, cujo final é imprevisível, pois não se sabe quem irá finar-se primeiro. Lutarmos
contra essa força que nos controlará uma vida inteira, se consentirmos.
Ah! Dirá, com certeza: é um fraco, que se deixa abater, se dominar, se arrefecer,
que se deixa regrar por essa insidiosa agremiação, malfadada conspiração
de homens, ditos “de bem”, que nas sombras conspiram, matam, se pervertem e nos faz crer,
ser essa a melhor forma de vivermos, nessa desgraçada sociedade, nesse mundo cão!
E o que nos escreveram sobre o amor? Meu personagem ama e sofre... suplício!
Creio que há algo errado; como pode tal sentimento, de tamanha nobreza causar-nos dor?
Não encontrei respostas. Vi foi personagens desgraçados, corroídos pela dor e pelo vício,
pelo ciúme, pelo desespero; alguns até me pareceram felizes, bom desempenho de um ator?
Entendo agora! O “Autor” criou somente a dor e, por piedade, o amor como consolo e alívio.
Se o enredo é a dor e o amor o bálsamo atenuante, então a vida é uma constante alternância,
uma colcha de retalhos, onde cada momento está retratado, resumo de todo um convívio
entre dois personagens nessa grande peça, onde os nossos sentimentos não têm importância
E sobre a generosidade? Como o amor, a dor e o ódio, temos uma dose de generosidade.
Mas, além dos sentimentos de dignidade, brio e nobreza, a adversidade domina nossas ações.
Para cada ato generoso, temos uma atitude de arrogância, soberba, intolerância e maldade.
Mas não somos inteiramente maus, ou bons, há uma dose de amor em nossos corações.
E sobre o último ato? O “Grande Autor” reservou para si o final de cada personagem,
não nos é dado o direito de sabê-lo, a surpresa é a grande emoção, a grande ansiedade.
O que angustia não é a saída de cena, mas saber se, ao cair do pano, atuaremos com coragem.
Permita “Ele” que nessa hora a platéia seja generosa, demonstre carinho e bondade.